2005/10/25

Espera, não vás
Tu és a minha Luz
A minha eterna saudade

Há mais de dois anos perdi a minha segunda casa, ainda hoje penso nela e hei-de pensar até ao último dia da minha vida. Porquê? Foi na Luz que nasci para esta paixão...

2005/10/20

Mais uma vez, pelo Benfica
Chega-se a Santa Apolónia quase onze horas depois de termos partido da Campanhã, o mesmo quer dizer às 11h30 da manhã de domingo, que é também o mesmo que dizer a horas impensáveis, depois de uma vitória no Dragão que serviu para vingar catorze anos de injustiças e jogos sujos. Tudo isto pelo Benfica. Ganhámos, mas mesmo que tivessemos perdido, a viagem de regresso tinha valido a pena pela aventura que se tornou, pois são estórias destas que fazem a história de uma época. Mesmo que não ganhemos nada, ficaremos com um rol de aventuras vividas que mais tarde vão ser recordadas por quem esteve presente e por quem gostaria de ter estado. E estes últimos só sabem verdadeiramente o que perderam se também estivessem presentes. De certeza que se ouvisse tantas peripécias passadas numa só deslocação, iria arrepender-me de não ter ido.

Não é todos os dias que se vence no estádio do nosso maior rival, por isso cada vitória é sentida com uma intensidade que mistura sentimentos de gozo por fazermos a festa em casa deles com alguns laivos de superioridade inerente ao facto de virmos da capital e representarmos o poder central que eles tanto criticam. Ganhar naquela terra, escassos meses depois de nos termos sagrado campeões também ali, é gozar literalmente com o orgulho daquelas gentes que só se sentem grandes quando ecoam pelo estádio a versão vernácula do Glorioso SLB.

Pouco mais de trinta e quatro horas depois desta aventura, mais uma vez o Benfica como motivo para fazer uma directa desde Lisboa até Villarreal. Foi a primeira deslocação ao estrangeiro que fiz de carro e ao longo da viagem foram várias as viaturas que se cruzaram connosco com o mesmo objectivo e ideal. É mesmo aconchegante saber que não estamos sozinhos, que há mais pessoas assim como nós, que correm atrás da nossa bandeira e do nosso símbolo. E ver isto fora do nosso país, da nossa cidade e do nosso estádio faz-nos sentir mais seguros e com um sentimento de invencibilidade ainda antes do jogo começar. São sacrifícios que acabam facilmente por ser feitos por gosto, em que nada perdemos e tudo ganhamos. Aprofundam-se conhecimentos e amizades. Conhecem-se novas culturas e rivalidades. Contam-se histórias de deslocações e jogos passados. E o pano de fundo é sempre o Benfica, sempre.

Villarreal é uma cidade pacata onde não se passa nada. Lojas fechadas durante todo o dia a meio de uma semana de trabalho. Não se vê vivalma nas ruas, a não ser os benfiquistas que vão chegando aos poucos. Não fossemos nós e arriscava dizer que não passava mesmo de uma cidade fantasma. Estava com algum receio deste jogo, mas bastou-me lembrar os últimos jogos do Benfica para me sentir mais confiante. E foi com esta postura que a equipa entrou no relvado. Que diferença em relação ao ano passado! Agora sim, jogamos futebol, ou melhor, jogamos à bola como eu gosto de dizer. No final do jogo, fiquei com a nítida sensação que podíamos ter ganho mas gostei da postura da equipa, da forma como se apresentou em campo. Sem medo. Com vontade de vencer. As papoilas saltitantes eram assim.

De todas as deslocações que fiz para ver o Benfica no estrangeiro, esta foi a que menos expectativas me formou. Não estava à espera de uma invasão de adeptos - o que se confirmou, até porque o Villarreal apesar de ser na vizinha Espanha, não tem o nome que tem o Man Utd, por exemplo - mas mesmo assim estiveram uns 1300 benfiquistas. E, tal como em Old Trafford, recebi mensagens a dizer que se ouviam muito bem na televisão. Mas desta vez não me causou tanto impacto, por uma razão: em Espanha não existe uma cultura de apoio como em Inglaterra, o que de facto se confirmou. Houve um momento que me deixou arrepiado, quando os dv1982 inciaram um cântico que entrou mesmo pelo intervalo dentro. Foram cerca de 12 minutos sempre a cantar o mesmo, com a alma e o peito cheio de crença, arrastando até os outros adeptos benfiquistas debaixo de uns choviscos que teimavam em caír. Infelizmente, ou não, situações como estas são raras. Mas são momentos como estes que nos fazem acreditar que podemos levar a equipa à vitória. Só assim se explica que durante tanto tempo o mesmo cântico seja ininterruptamente entoado. E, ao contrário do que ultimamente se tem escrito na imprensa, somos nós - os mais fanáticos - que estamos lá, a milhares de quilómetros de casa, para puxar pela equipa quando ela precisa. Tudo isto pelo Benfica.

Já fora do estádio, depois do jogo ter acabado vi o Miguel, ex-jogador do clube, à entrada da porta principal. Acho que ele não merecia mais do que o meu desprezo, mas não me contive.
- Devias ter vergonha na cara, atirei a uns metros.
- Podes falar comigo na boa, respondeu-me.
Sinceramente não esperava que ele me ligasse, ainda por cima estando ao telemóvel. E cheguei-me ao pé dele para dizer:
- Viste o Nélson? Não fazes cá falta...
Não lhe disse mais nada, nem ele respondeu. E continuei com a certeza que é mesmo assim.

Lisboa. Porto. Lisboa. Villarreal. Lisboa. Tudo isto pelo Benfica...!

2005/10/11

Ainda algumas divagações

Fazer escala em Frankfurt e, por via do destino, regressar num dos charters que ligaram Lisboa a Manchester.
Pagar bilhete de comboio para visitar Frankfurt sem saber que se podia andar sem pagar nada, se bem que não fosse permitido. E só perceber isto, depois da primeira viagem até ao centro desta cidade. Para a próxima, talvez esteja avisado. No fundo, não seria muito diferente do que eu fazia no metro alfacinha quando era mais novo.

Planear, ainda em Lisboa, o percurso desde o aeroporto a Old Trafford por comboio e eléctrico, sabendo que só tinha duas horas de margem até ao jogo começar. Mandar um email para o Man Utd a perguntar o meio mais rápido de fazer esse trajecto e receber uma resposta tão fria como estúpida: de táxi. Chegar lá, e perceber que se podia fazer, como acabei por fazer, esse percurso sempre na mesma linha de comboio. Razão: o estádio tem um apeadeiro que fica mesmo por trás da bancada principal e que dá um jeitão em dias de jogo.

Saber, de antemão, que os adeptos ingleses não iriam dar tréguas. Entrar no estádio com essa certeza e saír de lá com a alma cheia de orgulho por os termos calado. Ficar convencido, de vez, que fora das quatro linhas o futebol também é um jogo com muitas surpresas. Ver o jogo em pé, nunca sentado, e vibrar com o símbolo da águia estampado nas camisolas vermelhas a milhares de quilómetros de casa. E ver que, ao meu lado, tantos outros sofrem como eu.

Saber que se gasta dinheiro com fartura sem nada receber em troca. E querer repetir isto enquanto houver possibilidade e disponibilidade porque, infelizmente, não basta apenas o interesse. Chegar ao ponto de ter a certeza que, mesmo que soubesse qual iria ser o resultado de Old Trafford, tinha ido incondicionalmente na mesma. E perceber que, quando assim é, não há nenhum sacrifício que não seja brutalmente compensado pelas sensações que vivemos e experiências por que passamos.

De tantos momentos, se tivesse de escolher algum, aqueles minutos que se seguiram ao golo do Benfica vão morrer comigo...

2005/10/02

... em Old Trafford!
Passados cinco dias depois de ter estado em Old Trafford, não há uma hora de cada dia em que não pense nesse jogo. Mas, acima de tudo, não há sequer um momento em que não sinta um arrepio quando me lembro do ambiente que se proporcionou no nosso sector. Num post anterior disse que, quando pensava que já tinha visto toda a força do meu clube, é verdadeiramente incrível como nos apercebemos que ele é ainda maior do que pensávamos. Isto, após ter ido a San Siro ver o Benfica. Em Manchester, um ano e meio depois, apercebi-me que o significado de enorme não tem limite que consiga explicar quando é o Benfica que está em causa. Não consigo mesmo. E isso é algo que me deixa com um orgulho tal que, se o clube acabasse hoje, grande parte da minha vida daria lugar a um imenso vazio. Tenho de me sentir um privilegiado por poder ser deste clube que não escolhi por obrigação nem interesse. Mas simplesmente porque aprendi a amá-lo desde pequeno e assim irá continuar até ao fim dos meus dias. Nos últimos tempos, e ao fim de mais de 20 anos de vida clubística, aprendi que para se ter uma noção do verdadeiro peso do Benfica, é preciso ir lá fora vê-lo jogar. Em San Siro foi o que foi. E em Old Trafford foi o que eu jamais pensaria que pudesse ser. Se há país no mundo em que eu não pensava sequer que pudessemos ter um apoio ao ponto de calar os adeptos da casa, esse país é a Inglaterra. Os adeptos do Man Utd surpreenderam-me pela negativa. Estamos a falar duma cultura de apoio diferente da que estamos habituados, ou seja, participativos durante grande parte do jogo, coisa que não aconteceu por parte dos ingleses. Pelo contrário, deu-me muito mais a sensação que é a equipa que puxa pelos adeptos. À boa maneira portuguesa, portanto. Os do Benfica surpreenderam-me pela extrema positiva, porque foram exactamente o oposto. Um festival que ficará gravado na memória e que me faz esquecer aqueles momentos em que os adeptos assobiam e mandam a equipa abaixo quando ela mais precisa. Se fosse sempre assim...

Num país e num estádio onde as leis do futebol moderno roçam o ridiculo – para dar um exemplo, não se pode fumar no ground ou ver o jogo de pé, coisa que praticamente não vi nenhum adepto português cumprir – foi brutal ver tochas abertas no sector benfiquista e faixas e panos pendurados até junto dos camarotes na parte de cima da bancada. Mas, principalmente, foi fantástico termos obrigado os utilizadores desses camarotes a ver o jogo em pé, como que dizendo, a eles e aos seguranças, que naquele sector quem mandava eramos nós. Na verdade, apetece-me dizer que não foi só ali que mandámos. Foi, também, no estádio todo. Em Old Trafford. Num daqueles estádios habituados a cilindrar os adversários.

Confesso que sou um saudosista incurável quando se trata de certos assuntos e o Benfica leva-me demasiadas vezes às lágrimas. Em Old Trafford elas tinham de aparecer, sinal que houve momentos durante o jogo que ficarão eternamente gravados cá dentro. É absolutamente indescritível o golo do Benfica e a extâse daquele sector que ainda mais vermelho ficou. O poder gritar ‘golo’ naquele estádio com toda a força que os meus pulmões me deixavam. O querer repetir esse momento para que não sentisse o sabor da injustiça do jogo de San Siro. O ver que o meu clube, mesmo a milhares de quilómetros de Lisboa, arrasta aquelas pessoas todas a meio de uma semana de trabalho. Incansáveis no apoio e convictas de que as vitórias morais mais não são do que desculpas para nos orgulharmos do clube quando só o facto de ali estarmos todos já é desculpa suficiente do orgulho que temos por ele. Praticamente fiquei morto com o segundo golo dos ingleses, mas ao ver que o clube não merecia tamanha tragédia, só tive que repetir o que até então tinha feito: puxar pelo Benfica até ao fim. Eu e os outros milhares todos à minha volta. Mas de nada valeu a não ser as lágrimas que teimaram em aparecer. E, só por isso, até valeu a pena.

Cheguei a Lisboa escassas horas após o fim do jogo. É impressionante como em tão pouco tempo se vive e sente tantas aventuras e emoções pelo Benfica. Como fazemos sacrifícios que acabam por ser vividos com gosto e devoção. Como transformamos alegrias em tristezas e novamente em alegrias. Como tão facilmente gastamos dinheiro por uma causa para a qual tão dificilmente a maioria de nós tem possibilidades. Ou como as lágrimas acabam por secar quando me lembro naquele momento que é o meu clube que me proporciona todas estas vivências. Não sei se são verdadeiras experiências de vida, pois acho que há causas mais nobres que esta. Mas sei que mexem comigo, com o meu tempo, com os meus sentimentos. E sei que daqui a uns tempos vou relembrá-las, contá-las e partilhá-las com os meus amigos. Os que estiveram comigo e os que não estiveram. Foi a pensar nisto que ainda acabei por ir a pé para casa. Só mesmo o Benfica para me fazer viver assim.