Durante largos anos, há décadas atrás, Portugal vivia sob a égide dos três F. Futebol, Fado e Fátima eram os conceitos que uniam os portugueses numa sociedade profundamente atrasada a todos os níveis e que ainda hoje trás consequências bem visíveis. De Fátima, recuso-me a falar. Tenho demasiado respeito e pouco à vontade para escrever o que quer que seja sobre um assunto religioso, o que não significa que não tenha a minha opinião. Digamos que não é para aqui chamada. Do Fado, tenho a maior admiração por todas as razões e mais alguma. Porque é português e não tem tradução em mais nenhuma língua do mundo. Porque é um dos poucos símbolos que restam da identidade e cultura portuguesas. Porque remete para a melancolia que a saudade envolve, curiosamente, outra palavra sem tradução directa. Porque é uma palavra triste com tanta força que a torna bonita. E nunca ouvi ninguém dizer que as coisas tristes não são bonitas. E depois tem o extremo bom gosto de se fazer acompanhar por aquele som da guitarra portuguesa que o torna idílico. Do Futebol, posso dizer que até vivia sem ele. Mas falar de futebol é falar obrigatoriamente do Benfica e sem o meu clube já há muito tempo que não passo. Quando vi ontem em casa um jornal desportivo aproveitado para depósito de lixo, que guardei de propósito para mais tarde recordar a noite de sonho em Anfield Road, fiquei sem pingo de sangue. Foi como se me tivessem tirado um bocado dessa noite. E tendo em conta que foi uma noite intensamente vivida, um bocado acaba por ser muito. Também ontem, encontrei uma folha rasurada que tinha escrito 'Parking Benfica' que já nem me lembrava que a tinha trazido de Old Trafford e fiquei mais descansado, como se uma coisa tivesse compensado a outra. São pormenores como este que também acabam por definir o benfiquismo que corre nas veias. Em casa guardo inúmeras recordações do meu clube. Não é no meu quarto, é em casa, espalhadas pelas divisões. Para além de não ter paciência, não suporto arrumar tudo no mesmo sítio, na mesma gaveta, no mesmo armário. As coisas do Benfica são para serem livres, como sempre este clube fez questão de ser, mesmo nos tempos da outra senhora. É por isso que de tempos a tempos, quando menos espero e procuro, aparecem-me à frente certas e determinadas lembranças de épocas passadas. Há umas semanas, fui dar de caras com um bandeirão da época 1985/86 sagradamente guardado em casa. Pouco tempo depois, vivo uma noite europeia que me fez lembrar essa década em que o Inferno da Luz foi mitificado. Para de seguida, sair do país e experimentar aquela que foi, muito provavelmente, a melhor noite futebolística da minha vida fora de portas. De repente, chega-se à Catedral e quase tudo cai numa semana. De repente, desce-se do céu e afinal nem tudo é como gostaríamos que fosse. De repente, faz-se um Fado que tão depressa nos leva ao auge como a seguir nos deixa de rastos. O Benfica dos últimos tempos tem sido assim. Um amor trágico mas tremendamente compensador. Há alguma coisa mais genuína?
4 Comments:
Andas feito poeta andas...
Agora andares sempre a descer do ceu para o inferno, és lampião, só por isso nao é preciso dizer mais nada, porque lampião que se preze infelizmente já ta habituado a andar a sofrer desta maneira, vida de Benfiquista é mesmo assim!
Abraço do outro lado oh poeta.
Bolas, esse bandeirão é tão velho quanto a Pulga :P
Não há sentimento mais único que o sofrimento de um benfiquista ;)
Não consegui ler o texto até ao fim. Com esse tamanho de letra e sem quebras torna-se impossível de o ler sem fazer um esforço do caraças.
Vê la isso pah :P
Abraço
Não conseguiste porque o que tu querias era que eu falasse em Godsmack e afins. Mas não, falei em Fado e os teus olhos minguaram :) Falar do Benfica é falar de Fado ou não estivessemos nós constantemente rendidos ao sofrimento. Mas não deixas de ter alguma razão. Faz assim: junta-te com o SLBenfica Supporter e façam uma manifestação a pedir uma letra de tamanho maior ;)
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